Inspiração



Um bocadinho de mim em palavras soltas, libertas pela digitalização da mente.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

A tua ausência...



A TUA AUSÊNCIA

O sol já se pôs… A tua altura do dia preferida. Adoravas sentar-te nesta mesma poltrona onde estou, comigo aninhada no teu colo, e presenciar um dos grandes fenómenos da natureza, como tão sabiamente dizias. Gostava de o fazer também agora, procurando assim algo que me ligasse a ti, porém desde que partiste, tornou-se um fardo demasiado pesado, acordar as memórias. Agora quando olho pela mesma janela, concentro-me antes na azáfama da multidão que corre lá em baixo na rua, rua que tantas vezes percorremos abraçados. Ao olhar para eles, tento afastar-me de mim. Do meu interior escuro e sombrio, forrado com o mais triste sentimento. Consigo focar-me em algumas pessoas e esquecer-me de mim, de nós. Mas hoje não funcionou. Apesar de me tentar focar nas cores, nos movimentos, nos cheiros que vem da rua, tudo o que me invade a mente é a tua imagem. E de repente a minha imaginação prega-me novamente uma partida e eu vejo um vulto que se parece exactamente contigo. Eras tu? Aquele vulto que surgiu de repente eras tu? Poderia jurar que sim mas sei que não juraria em verdade. Desde a tua partida que a minha mente me ilude e eu julgo vislumbrar-te no meio da cidade, desta multidão agitada que polvilha Lisboa. Sinto o teu perfume, ouço o teu riso, avisto o teu passo ligeiro e desengonçado. O meu coração pára mas só até perceber que não és tu.

Olho pela janela e vejo que começou a chover tal como no dia em que partiste. Primeiro, apenas algumas gotas que vieram brincar no vidro, depois uma torrente de água que desce pela avenida.
Sabes o que isto me lembra?
Será que ainda te consegues lembrar dos nossos momentos mesmo apesar da distância?
Espero que sim mas temo que não.
Lembra-me aquela vez quando ficamos horas debaixo da chuva, a sentir cada gota a entranhar-se na nossa pele, mas com a plena convicção de que não sairíamos dali porque isso significaria separação.
Mas afinal foi o que aconteceu, não foi?
Ainda hoje me pergunto o porquê, mas aos poucos fui desistindo de tentar encontrar respostas que estão fora do meu alcance. Respostas, que se encontram no mais intimo de ti, no meio dos teus labirintos, cuja porta são os teus olhos meu enigma.

Olho pela janela e aprecio as novas cores que pintam o céu agora. O sol já se pôs e o céu cobriu-se de cinzentos e negros que fazem adivinhar uma noite repleta de estrelas. Vês as mesmas estrelas do sítio onde estás? Pensas em mim tal como penso em ti, meu amor?
Sabes, apesar de lindas, são estas as cores que associo à tua ausência, ao vazio que ficou no teu lugar. Foram estas as cores que tu usaste para tingires a tela dos meus dias desde que partiste.
Pergunto-me se já não me amarás ou se a nossa história é agora apenas uma lembrança rasurada na tua mente.
Apesar de tudo, continuo a procurar-te entre os estranhos que encontro no caminho para casa, continuo a procurar pela tua presença, por algo que me ligue a ti de uma maneira indelével.

Esqueci-me de te pedir uma coisa na primeira e última carta que te escrevi. Logo depois de partires, naquele enorme avião que te levou para milhares de quilómetros de distância, percebi que tinha deixado, uma coisa que me é imprescindível, contigo. Podes, por favor, procurar? Talvez nos bolsos das calças, na mala ou.. não, não! Esquece tudo e procura no bolso interior do casaco, naquele perto do coração. Encontraste? O meu bocadinho de coração foi à procura do teu e acabou por ficar contigo. Importas-te de me devolver? Farias isso? Ou irias ser teimoso e guardá-lo só para ti?

Olho pela janela e surpresa! Tal como chegou a chuva foi embora e deixou-me sozinha. Era o seu som que me embalava ternamente nos meus doces pensamentos sobre ti.
Não quero ficar sozinha, por isso começo a pensar em que livro irei pegar para me tentar transportar para outro mundo, Um mundo em que nós não existimos e em que o único silêncio vazio é aquele entre parágrafos.

Estão a tocar à porta e sobressalto-me com o som da campainha. O “Trimmm Trimmm” insistente já é desconhecido para mim. Desde que saíste que não recebo os amigos em casa e muitas vezes quando a campainha toca estou tão absorta em recordações que nem noto. Porquê, perguntas tu? Porque todos os amigos me fazem lembrar de ti, da tua voz, da tua presença junto a mim quando nos reuníamos à sexta-feira à noite para relaxar. Tornei-me uma má companhia, pois a única presença que realmente anseio é a tua. Antes de abrir a porta, volto-me de novo para a janela e reparo num olhar demasiado familiar. Mas quando olho novamente já não está. Hoje as memórias afloraram mais do que o costume.
Sinto a tua falta…

Abro a porta ainda melancólica e vejo uma senhora, vizinha parece, um rosto que não reconheço, com uma carta na mão. Entrega-me e diz-me que o correio se enganou e pôs na caixa de correio dela. Será que foi isto que aconteceu com as tuas cartas? Extraviaram-se antes de chegar até mim, por isso é que nunca as recebi? Ou simplesmente não as escreveste?
Volto-me decidida a mergulhar em literatura e esquecer a saudade por umas horas, quando novamente a campainha dá sinal. Suspiro, contrariada porque não me apetece manter conversa com pessoas estranhas, nem magicar palavras simpáticas quando tudo o que quero é gritar de desespero. Engulo as lágrimas que vieram sem serem chamadas e abro a porta … o mundo pára, o coração bate descompassadamente e os joelhos cedem.
Deixo-me cair no chão, incrédula da veracidade deste momento. Não posso acreditar… és tu.. .tu… o vulto da minha imaginação! Como podes ser tu?
Os teus braços envolvem-me, a tua respiração aquece-me e eu tenho finalmente a certeza - és meu novamente!

Olho pela janela, uma última vez antes de me perder em ti e observo a chuva. Ela voltou, desta vez não com som de despedida e solidão. As gotas da chuva desenham na janela pontos indecifráveis enquanto a tua voz me sussurra ao ouvido, a única coisa que esperei ouvir depois de tanto tempo - “Amo-te”

2 comentários:

  1. Awwww *_*

    Mais um texto lindo teu, Miri ^^
    Adoro a maneira como consegues explorar os sentimentos dos teus personagens e a maneira como os descreves. Invejo-te por isso, sinceramente.
    Pensei seriamente que fosse terminar a leitura deste texto como terminei a do "A Walk Through the Park": com lágrimas nos olhos. Felizmente isso não aconteceu xD
    Começo a aperceber-me que tens tendência para escrever sobre situações bastante difíceis de gerir psicologicamente. Mas fazes isso muito bem, portanto os parabéns são devidos =)
    Continuo a dizer que gosto imenso da maneira como se nota a influência dos clássicos na tua escrita. Os teus personagens têm muitas características do período Romântico.

    Dei por falta de uma ou outra vírgula, mas fora isso não há mais nada a apontar. E, assim como assim, se todos os problemas fossem faltas de vírgulas estava o mundo muito bem xD

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  2. Humm... um final feliz tão bom!!

    Consegues descrever muito bem as tristezas, e melancolias de amores negados ou perdidos, cheira-me que vais escrever um grande clássico dramático :)
    ...mas com final feliz está bem?
    Adoro finais felizes *.*

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