Inspiração



Um bocadinho de mim em palavras soltas, libertas pela digitalização da mente.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Aromas Irrepetiveis




Em breves segundos, tingidos pela cor da tua pele, em que me pergunto:
- Quem és tu, estranho desconhecido?
És a sombra recortada daquilo que quero em mim. Tu não és como eu desenhei. O teu olhar penetrava-me na alma enquanto partias para longe, para bem longe de mim. E enquanto isso era nos teus passos que me perdia, na musicalidade inerente ao teu andar desengonçado. Compasso marcado pelas rugas de expressão que fazes quando a tua alma sorri.
Voltei a ter aqueles pequenos e fugazes arrepios em que o meu corpo se perdia quando me tocavas. Via-me preso em memórias que ressuscitas-te quando me voltaste costas. Memórias que até então estavam enterradas na mais longínqua encruzilhada para lá da ponte, para cá da biblioteca, no meio da minha mente. A minha alma tornara-se vazia sem aquela nossa simbiose constante de pensamentos. Partiste e deixaste-me só, sem um pedaço do que era, um pedaço que, sem ti, jamais poderá ser preenchido.
Eu existia em ti. No doce paladar das tuas palavras encontrava as razões para toda aquela insanidade. Querer-te sem te poder ter por completo. No suave rogaçar dos lençóis, encontrávamos o som da pertença, da exclusividade de sermos um só. E agora nada disso é real. Esta noite estou só e o mundo em que me perco não é mais o teu.
Os aromas que eu um dia fixei graças a ti fugiram. Não são mais meus. Não são mais nossos. Pergunto-me, depois daquela noite lúgubre, será que ainda temos algo nosso? As palavras sonantes em sinfonia que antes éramos capazes de saborear agora são como o limão, ácidas, e vão-me queimando os dedos à medida que vou tocando nos lençóis, tentando, uma última vez, absorver o teu perfume. Aquele que, no outro dia, o meu corpo emanava e que com ele, com o aroma do teu perfume, eu adormeci na última noite.
Agora sou apenas um vulto de nós dois, perdido numa nuvem de cetim branca. Só o contorno do meu corpo preenche este espaço e só eu olho a noite através daquela janela. Lembraste quando nos amámos tendo as estrelas como espectadoras? Lembraste da sensação de continuidade dos nossos corpos? Hoje, vagueias na minha memória, junto com suspiros e arquejos.
Memórias amargas de beijos irrepetíveis que me rompem e rasgam a alma.

Miri* e Ricardo Cunha
(Texto resultado de uma colaboração com o ricardo - to one in paradise partindo das últimas frases do meu último texto. )

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Estranho Desconhecido...


Momentos furtivos serpenteando por um tempo que não é nosso. Um querer traduzido em pequenos silêncios cúmplices, que nos unem com invisíveis cordéis de vida.
Olhares sussurrados num dialecto cerrado, de sons contrastantes e que nenhum dos dois domina.
A tua mão perdida na minha cintura, enquanto a minha respiração espera pacientemente a tua. Um recuo leve na realidade e um arrepio na pele, quente de antecipação.
No toque subentendido de pensamento, a inexperiência do desejo de entender aquilo que podemos ser juntos. Segredo guardado entre as paredes da nossa loucura.
É a tua voz profunda junto ao meu ouvido , suave caricia no coração, que me avisa da escassez dos minutos que nos restam. É o cheiro do teu perfume que me inebria e me tira a razão. Simbiose de ti no vulto esquecido de quem já fui.
No intervalo das sentenças ensaiadas que proferes é no desenho dos teus lábios que me fixo. Breves segundos, tingidos pela cor da tua pele, em que me pergunto - Quem és tu, estranho desconhecido? 
És a sombra recortada daquilo que quero em mim.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Critica a "Solitude - Pequenas Histórias de Grandes Viagens" de Sérgio Brota:



Solitude - Pequenas histórias de grandes viagens
"A viagem é uma forma privilegiada de acesso ao conhecimento; possibilita a reflexão e o crescimento pessoal.
Por isso, quem tem alma de viajante procura a diferença, não a semelhança. E ser viajante é muito mais do que ser turista: é percorrer o mundo como uma criança, mastigar devagar alimentos que não se conhecem, experimentar sensações novas, ver tudo como se fosse a primeira vez; é deixar que outras pessoas e outras culturas nos emocionem e nos deixem mais ricos como seres humanos."
Roland Barthes

Nota do Autor :
Solitude conta as minhas voltas pelo mundo durante os últimos anos.
Gosto de lhe chamar um livro para viajar mais do que um livro de viagens, recolhe algumas histórias que me aconteceram em locais como a Patagónia, a Islândia ou a percorrer 1/3 do mundo de combóio pelo transiberiano. Mas qualquer uma delas podia ter acontecido convosco. Mais do que um conto, é um convite.


Opinião Literária:

Palmilhando o Japão e encontrando pontos de encontro na paisagem vista do céu, atravessando oito fusos horários a bordo do Transiberiano, descobrido o Médio Oriente vendo o nascimento e a morte do sol nas margens do Nilo. Sentido no sangue a vibração musical e cultural de Cuba, o transpirar da revolução em cada poro. Visitando os recantos da Patagónia ou sentido o frio dos fiordes da Islândia, ouvindo o doce para a alma que a Natureza nos permite alcançar.
Parece-lhe bem? Para tudo isto temos um bilhete de ida quando lemos “Solitude- Pequenas Histórias de Grandes Viagens” de Sérgio Brota. Uma viagem literária que nos faz abraçar o inexplicável de outros mundos. Sentir o aroma e ouvir o som de outros universos.
Num livro assumido como um projecto muito pessoal, tal como o próprio autor confessa, vamos acompanhando o percurso por terras longínquas feito por este engenheiro que encontra nas viagens uma forma de evasão. Com fotografias que acompanham o relato dando-nos um vislumbre mais acentuado daquilo que foi vivido, o autor vai descortinando para o leitor os pedaços do desconhecido. Sérgio Brota conserva durante todo o livro o mesmo registo literário, um tom impessoal mas que ao mesmo tempo nos consegue envolver pela simplicidade. Sente-se nas palavras o objectivo de não conduzir o leitor a nenhuma opinião induzida, deixando que cada um tire as suas conclusões. É isso que leva cada um a desejar fazer as mesmas viagens, percorrer os mesmos trilhos e descobrir tal como o autor a maravilha do inóspito. Um livro que recomendo a todos os que amam a viagem, o descobrimento de si próprio nas marcas de outros povos. Uma boa companhia para uma tarde bem passada.

Pontos Positivos: Todo o Design do livro é atraente. A capa faz-nos ter vontade de o comprar e explorar. No interior o toque de simplicidade estética mas pormenorizada é agradável à vista e dá-nos uma pista dos recursos visuais na escrita que iremos encontrar ao longo do livro. Uma notável conjugação da experiência de fotógrafo do autor com a escrita.

As fotografias, bem escolhidas, dão um “empurrão” na nossa capacidade de imaginar o que foi visto.

Nunca fazendo demasiada referência com quem viaja o autor permite-nos  acompanhá-lo sem nos sentirmos intrusos. Somos nós leitores os seus companheiros e guiados pela grafia das suas palavras.

Pontos Negativos: Em algumas passagens permitia-se um tom mais pessoal, que mostra-se mais o quanto estas viagens mudaram o autor. As emoções bem doseadas são um bom aditivo nas narrativas de Viajantes – Escritores. Paul Theroux é um bom exemplo disso.

Algumas das fotos teriam mais destaque e seriam mais compreensivas para o leitor se tivessem a cores. O contraste visual teria mais força na mensagem que querem transmitir.

Nota (1-10): 7

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Puro amor




O tempo passa mais devagar agora, nesta realidade clara que nos envolve aos dois em suaves teias de cumplicidade. Espaço entre momentos que nos dão a certeza de estarmos fundidos um no outro, em cada pedaço de pele. Impressões digitais de caminhos só nossos, que levam o aroma dos dois, a chocolate e algodão-doce. Uma estrada de vida partilhada e percorrida a um ritmo compassado, idêntico. Cartas de amor escritas com sorrisos. Visão partilhada do ser. Um eterno reconhecimento de mim própria em ti.

Puro amor.

">Banda sonora: Say What You Want - Texas

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Há dias assim... como diz Marc Levy




" Há dias iluminados por pequenas coisas, pequeninos nadas que nos tornam incrivelmente felizes; uma tarde a comprar antiguidade, um brinquedo antigo que encontramos num ferro-velho, uma mão que agarra a nossa mão, um telefonema de que não estávamos à espera, uma palavra doce, o filhos que nos abraça sem pedir outra coisa senão um momento de amor. Há dias iluminados por pequenos instantes de graça, um cheiro que nos enche a alma de alegria,um raio de sol que entra pela janela, o barulho de uma chuvada quando ainda estamos na cama, ou a chegada da Primavera e dos seus primeiros rebentos"

E acrescenta sabiamente...

"Há dias feitos de pequenos nadas, dias de que nos lembramos tempos depois, sem que possamos saber porquê."

In "O primeiro dia" Marc Levy

Hoje é um dia assim... Um dia em que a tua lembrança apenas traz coisas boas...

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Opinião "O primeiro Dia" Marc Levy


Sinopse:


Um objecto misterioso encontrado num vulcão adormecido vai mudar para sempre a vida de Adrian e Keira. Juntos embarcarão numa aventura extraordinária que os levará das margens do lago Turkana, no coração de África, até às montanhas da China, em busca da resposta a uma das perguntas ancestrais da humanidade: como começou a vida na Terra?


Opinião: 

Marc Levy é considerado o autor francês mais lido em todo o mundo e este romance atesta o porquê da escolha de milhares de leitores.

Em “O Primeiro Dia”, Levy conjuga paleontologia, astrofísica e amor numa receita irresistível que prende o leitor do princípio ao fim. Ao longo da narrativa vamos conhecendo Keira e Adrian, personagens principais desta história, e é durante a sua busca pelo esqueleto do primeiro homem e pela descoberta do sítio onde começa a aurora, que vamos ficando entrelaçados na história do casal, misturando sentimentos profundos com conhecimentos sobre os nossos antepassados e sobre a vastidão do universo que nos rodeia. Concentrando todo o “plot” na descoberta do significado de uma jóia que Keira possuía, Levy leva-nos numa viagem trepidante e perigosa por países como Grécia, China, França e Inglaterra. Dando-nos todas as provas do seu talento descritivo, o autor encanta-nos com os relatos vívidos de paisagens luxuriantes, que nos transportam para junto das personagens e nos fazem viver cada movimento dos mesmos.
Um livro que recomendo a todos os que gostam de romance aliado com uma imensidão de cultura geral e deixando o cheirinho da literatura de viagens no ar.

Melhor personagem: Adrian. O personagem principal deste livro e também narrador, é sem dúvida a personagem mais bem conseguida. Consistente desde o inicio, Levy traça-nos com palavras o rosto e a personalidade de um homem que reconhecemos como alguém real e quase palpável. Um homem que poderíamos encontrar numa biblioteca perdida no meio de Londres, ou nos alfarrabistas do mercado de Camden. Em duas palavras: Inteligente e Romântico.

Ponto Positivo: O facto de ao longo de todo o livro termos quase uma aula de astrofísica e de paleontologia, além de considerações sobre a importância de Deus na vida do ser humano torna o livro mais rico e interessante.

Ponto Negativo: A péssima tradução! Em cada página podem encontrar-se erros crassos de tradução que desvirtuam em muito a qualidade do texto original. Para quem entende francês aqui fica o conselho: Marc Levy é muito melhor lido na sua língua original.

Melhor trecho:

"Ficarei aqui contigo, meu amor, até ao fim fico aqui ao pé de ti, até ao fim e mais ainda. Nunca te deixei. Abracei-te e beijei-te quando as águas do rio Amarelo nos engoliram e te dei o derradeiro sopro da minha respiração. Esse ar dos meus pulmões era o teu ar. Fechaste os olhos quando a água cobriu as nossas faces ;conservei abertos os meus olhos até ao teu último instante de vida. Eu tinha partido em busca de respostas para as minhas perguntas de menino, e fizera-o no mais profundo do Universo, nas estrelas mais longínquas, e tu estavas lá, estavas lá ao meu lado. Sorriste, os teus braços prenderam-se em volta dos meus ombros e eu não senti nenhuma dor, meu amor. Depois o teu abraço desfez-se, e foram esses os meus últimos instantes de ti, as minhas últimas recordações, meu amor, perdi a consciência quando te perdi."


Classificação (1-10) - 8

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

...


"O tempo não pára! Só a saudade é que faz as coisas pararem no tempo." (Mario Quintana)

terça-feira, 21 de setembro de 2010

A uma grande amiga...


Hoje voas para longe. Para um sitio desconhecido de ambas onde os sons e os aromas ainda não conduzem a memórias. Onde o as ruas que percorres nada têm a ver com a nossa Lisboa. Aquela que inspirou dezenas dos nossos textos e que ainda nos faz suspirar quando nos afastamos. Vais traçar novos caminhos no mapa da tua vida e embora longe geograficamente eu vou estar sempre por perto, porque aquilo que nos ligou é muito mais forte do que o espaço que nos separa. Não é? A saudade é tramada. Faltou-me aquele abraço e aquele lacrimejar especial. Espero-te em Dezembro?
Vive cada minuto intensamente e regista tudo para me contares com pormenores esta nova etapa da tua vida.

Com todo o carinho,

Mana*

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Sem Titulo




Olho em volta e procuro-te. No meio das paredes despidas tento encontrar uma recordação tua. No silêncio sepulcral que nos separa, busco pelo som do teu riso. Apenas me chega o barulho da falta de palavras.
Ando sem rumo, arrastando o corpo que já não reconheço. Percorro cada centímetro do espaço onde estiveste, tentando reconstruir aquilo que não mais voltará a existir. Apesar de estarmos em pleno Agosto, o frio abraça-me com o mesmo cuidado com que tu o fazias. Momentos passados, perdidos em emoções já esquecidas.
Ao longe, junto à janela ampla que nos serviu muitas vezes de pano de fundo para nos perdermos um no outro, vislumbro o recorte da tua silhueta. O teu perfume atinge-me e a exigência de te tocar torna-se demasiado pesada para ser ignorada. Tropeçando nas raízes fundas do meu amor , corro com lágrimas rasando a superfície dos olhos pretos que tu antes exploravas. O teu corpo não reage ao ruído dos meus passos na madeira gasta do soalho, nem ao ofegar da minha respiração e percebo que estás longe. Refugiado num sítio onde nunca poderei entrar.  Estás escondido nas muralhas do corpo de outra mulher, nas memórias do seu corpo e no aroma da sua pele. Saber que a emoção que espelhas no teu rosto não me é dirigida  tem um sabor amargo.
Cruzo-me com o teu olhar e entendo que já não me vês. Para ti sou apenas uma brisa invisível que um dia te fez apertar um pouco mais o casaco contra o corpo. Impressão passageira e monótona que nunca voltará. Tal como aquilo que um dia disseste sentir.


(Este foi o 1º texto que escrevi para o concurso de drabble com o tema Solidão mas acabei por ultrapassar o limite de palavras e não enviei :)

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Make You Feel My Love





When the rain is blowing in your face,
And the whole world is on your case,
I could offer you a warm embrace
To make you feel my love.

When the evening shadows and the stars appear,
And there is no one there to dry your tears,
I could hold you for a million years
To make you feel my love.

I know you haven't made your mind up yet,
But I would never do you wrong.
I've known it from the moment that we met,
No doubt in my mind where you belong.

I'd go hungry; I'd go black and blue,
I'd go crawling down the avenue.
No, there's nothing that I wouldn't do
To make you feel my love.

The storms are raging on the rolling sea
And on the highway of regret.
Though winds of change are throwing wild and free,
You ain't seen nothing like me yet.

I could make you happy, make your dreams come true.
Nothing that I wouldn't do.
Go to the ends of the Earth for you,
To make you feel my love 

Best Song*

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Oscilação


A corda mostra-se firme à minha frente. Do outro lado dela, vejo um rosto familiar que me faz disparar o ritmo cardíaco. Os olhos azuis brilhantes fixam-me e fazem-me tremer. Daria tudo para que me transmitissem amor, mas bem no fundo tudo o que encontro é indiferença.
Avanço, dou um passo e olho a imensidão de espaço vazio por baixo de mim. O risco de cair aumenta a carga de adrenalina e desejo mais do que nunca a vertigem da queda…do esquecimento. Com uma pirueta no ar arranco à multidão um suspiro expectante, de medo mas também de admiração. Como eu gostaria que essa sensação passasse também para ti.
Sim, tu que me esperas do outro lado desta passagem fina e rugosa. Receber-me-ás nos teus braços mas não me acariciarás, apenas levantarás o meu braço e farás um trejeito encantador, porém falso, que te dará os aplausos de que tanto gostas.
Inclino a cabeça para baixo e observo com mais atenção os espectadores desta noite. Será que lhes daria hoje o espectáculo da sua vida, ou apenas lhes entregaria a dádiva de uma boa noite de espectáculo circense?
Será que sentirias a minha falta se o imenso vazio por baixo de mim me tragasse? Ou seria apenas a dor superficial da perda de alguém a quem já não amas?
Olho na tua direcção e tento esboçar pela última vez um sorriso carinhoso somente dirigido a ti, mas tu não reparas. Toda a tua atenção e amor estão concentrados na mulher atrás de mim. Aquela a quem agora amas. Aquela por quem me trocaste.
A dor trespassa-me e decido. Limpo as lágrimas e num último adeus ao meu público mergulho elegantemente, com firmeza  em direcção ao nada. Adormeço para sempre, vendo finalmente no teu olhar a dor de perder quem amamos.

(Triple-Drabble para concurso do Creative)

Despedida


O teu nome ressoa insistentemente na minha mente. Entre o nevoeiro que separa o nosso mundo da realidade de todos os outros, sei que já lá não estás. As ruas cheias que construímos estão agora desertas, como se fosse apenas a tua presença a enche-las. Eu já não sou suficiente. Nunca fui sem ti. As superfícies espelhadas que antes reflectiam os nossos sonhos agora apenas retribuem imagens de mim mesma. Cansada, triste e eternamente sozinha.
Estendo a mão e tento encontrar a tua, mas tudo o que encontro é espaço vazio, cheio de um ar sufocante que faz doer. A tua inexistência magoa.
O mundo real já não é palpável e eu afundo-me em ti. Em ti, que já não existes. Em ti, a quem peguei na mão já sem vida. Contrariada pela exigência de te voltar a sentir levanto-me da cama ,que ainda tem o teu cheiro, e corro até à aparelhagem. Quando o som me atinge, as lágrimas caem pela primeira vez. Balanço-me ao som da última música que dançámos juntos e deixo-as marcarem os caminhos que tantas vezes percorreste com as tuas mãos. Abraço-me, fingindo que é o teu corpo que me embala e despeço-me de ti.

(Double-Drabble para o concurso do Creative)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Liberdade


Corro em direcção a ti, saltando barreiras invisíveis que me apertam a alma. Mãos puxam-me para o nada, para o vazio da inércia e do silêncio. A pele arde-me com o toque do medo e faz-me lembrar a dor de permanecer calada no meio do barulho da injustiça. Lembro-me do preconceito que sempre me rodeou e revolto-me com a imagem. Tenho a tentação de parar. Mas não posso, pois levo comigo a esperança de milhares de mulheres que lutaram por ti. Corro mais depressa, ignorando as vozes, e alcanço-te. Abraço-te, enquanto as lágrimas caem e eu grito, enfim: LIBERDADE!


(TEXTO CONCEBIDO PARA O CONCURSO DE DRABBLE 1º FASE DO PORTUGAL CREATIVE :P)

Título Original: The Year of Fog


Autor: Michelle Richmond

Editora: Editorial Presença

Colecção: Grandes Narrativas, nº474

Tradução: Maria João Ferro

Data 1ª Edição: 20/07/2010

Sinopse:
 Uma mulher e uma criança passeiam na praia, numa fria manhã de Verão. O nevoeiro é tão denso que a visibilidade não ultrapassa alguns metros. A criança, irrequieta, solta-se por momentos da mão da mulher e não volta a ser vista. Fazem-se repetidas buscas, mas decorrem dias, semanas, meses e não se encontra rasto da menina desaparecida. Uma história pungente, escrita da perspectiva de uma mulher que, por uma desatenção de segundos, se torna responsável pelo desaparecimento da filha do homem que ama.


Opinião:

Com uma linguagem fácil e cativante, Michelle Richmond traz-nos a história de desespero de Abby, que num momento de distracção visual, perde de vista a filha do seu noivo, Emma, e ela desaparece. Misturando a busca incessante do casal com vislumbres do complexo mundo da fotografia e tocando nos segredos da memória, a autora estimula o nosso conhecimento e deixa-nos expectantes por aquilo que virá a seguir.


"O Ano do Nevoeiro" é um relato vivido do desespero de todos os pais que passaram pela experiência traumatizante de perder um filho. O passar dos dias a conta- gotas, a sensação de impotência e o desgaste emocional são descritos habilmente, com a dose certa de dramatismo, sem exageros ou falsas pretensões de impressionar mais do que o necessário e é isso que faz com que o leitor fique com o coração apertado e sinta o desejo premente de ajudar na busca de Emma.


Contrabalançando a tensão pintada em cada página, Richmond oferece-nos um final diferente do que acontece na maioria dos casos da realidade, mas apesar do cheiro a milagre que fica no ar, a autora não deixa de nos passar a mensagem que a dor da perda deixa cicatrizes profundas que transformam a vida de modo indelével.


Um livro forte e sentimental que nos desenha o amor de uma forma muito mais abrangente. Um tributo a todos os que já passaram pela mesma dor.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Passatempo as Filhas do Assassino




Habilita-te a ganhar um exemplar do livro "As Filhas do Assassino" aqui:

http://portugalcreative.blogspot.com/2010/07/passatempo-as-filhas-do-assassino.html

Passatempo válido até:

04.08.10

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Ashes and Snow

Arrepiante a cada imagem... a sensibilidade de Gregory Colbert :)



quarta-feira, 14 de julho de 2010

Grãos de areia




- Mãe quero ir contigo apanhar conchinhas! – Maria esperava ansiosa com o balde na mão e olhos brilhantes.

- Desta vez não, querida… - Não gostava de estragar a expectativa da minha filha mas precisava mesmo de estar sozinha.

- Porquê mãe? Tenho de apanhar conchinhas para oferecer ao pai quando ele voltar… Por favor, por favor, por favor? – Disse juntando as mãozinhas em sinal de prece.

- Não, Maria e acabou-se a conversa. Vais ficar aqui e não quero ouvir nem mais uma lamúria ouviste? – Tinha falado de maneira demasiado ríspida e sabia disso mas agora não havia volta a dar. Maria correu para o quarto chorando baixinho e senti o peito pesado de culpa. Não queria magoar a minha filha, muito menos nesta altura.

“Quando voltar falo com ela com calma” pensei. E teria mesmo de o fazer.

*

Olho o banco de areia ao fundo e sinto o desejo súbito de atravessar para a outra margem. A lembrança do meu corpo junto ao teu e de todas as juras de amor que fizeste ao meu ouvido naquele dia ainda me arrepiam a pele. Momentos perdidos em grãos soltos de areia dourada.

Com o sol dizendo adeus à vila que nos acolheu, quando fugimos do nosso antigo mundo, sento-me enquanto desenho no piso molhado o teu nome. As cores abraçam-me em segredo e o meu peito enche-se de vermelhos e laranjas que me fazem fechar os olhos e viajar novamente para o passado.

O vestido branco que tu mais gostas acaricia-me o corpo. Vesti-o para ti, mesmo sabendo que nunca mais ouvirei a tua voz dizer-me o quanto realça a minha pele morena. As saudades batem forte quando as memórias se tornam tão vivas como neste momento em que quase sinto o teu cheiro. Como vou viver sem ti, meu amor?

Na minha mão aperto os envelopes já gastos que contêm as únicas três cartas que recebi vindas desse país que te roubou de mim, durante estes anos de ausência forçada. Reli-os vezes sem conta e é por isso que o branco do papel onde salpicaste a tua história tornou-se velho e gasto. Sei que vou ler estas cartas hoje pela última vez e por isso escolhi este sítio que nos abrigou quando os piores pesadelos se tornaram parte da nossa realidade.

Passo suavemente os meus dedos pela superfície rugosa do papel, imaginando que também o fizeste e este momento une-nos novamente. Pelo menos, na minha pobre e triste ilusão.

*
21 de Dezembro de 2007

Querida Anne,

O tempo escuro lá fora confunde-me. Neste sítio nunca sei quando já é noite ou se a escuridão que vejo é apenas fruto dos vestígios cinzentos de uma explosão que dizimou mais vidas. Hoje não faço ideia do que se passa lá fora. Às vezes ouço as vozes de colegas que passam apressados para se juntar às vigílias mas parecem-me muito distantes, como se fizessem parte de outra realidade que não a minha. À semanas que não me era permitido descansar, mas quando estava quase a tocar o ponto de esgotamento, alguém se lembrou que os médicos também precisam de repouso.

Se já for noite, sei que estarás com Maria no quarto a aconchegar-lhe a roupa para ela dormir. Sei que a tua voz vai encher o quarto ao cantares aquela canção de embalar preferida dos três. E sei também que a minha presença, encostado à ombreira da porta, olhando com carinho as mulheres da minha vida.
Meu amor… como dói estar longe e saber que tão cedo não vou vislumbrar o azul-céu dos teus olhos, nem abraçar o corpo quente e pequeno da nossa filha. Maldita guerra que me afastou de vós e daquilo que amava.

Aqui, onde a morte se encontra comigo a cada minuto sinto mais medo do que alguma vez senti. Muito mais do que experimentei em toda a minha carreira como médico, em que a vida das pessoas dependia da minha vã sabedoria. Pela primeira vez, sinto medo de não voltar a ver-vos.

Só quero que saibas que penso em vocês a cada momento. Que é a vossa imagem e a recordação de casa que me faz continuar a cada dia, esperando pacientemente a hora do retorno. Tenho que voltar ao serviço. Jerry chama-me. Lembras-te dele? Tenho a certeza que sim. Tem sido um bom amigo e é com ele que tenho desabafado. Somos uma ajuda um para o outro. Tentamos manter-nos sãos no meio deste mundo louco.

Beija Maria por mim e diz-lhe que sinto muito a sua falta.

E lembra-te…Amo-te mais do que tudo, Anne… Para sempre

*

Um vento frio começou a levantar-se enquanto lia novamente as tuas palavras. Foi como se viesse acompanha-las, trazendo o frio da distância para junto de mim. Olho para o céu colorido à minha frente e penso nas inúmeras vezes em que nos deitamos juntos neste areal, ouvindo o leve e quase murmurante som das ondas, enquanto sincronizávamos a nossa respiração e o bater do coração. Éramos um só. As lágrimas ameaçam sair, mas, autoritária, mando-as fecharem-se dentro de mim. Não quero chorar agora. Talvez mais tarde…

*
01 de Novembro de 2008

Meu amor…

Hoje recebi a notícia que mais temia desde que cheguei. A guerra piorou e milhares de soldados nossos faleceram em combate, tentando honrar uma pátria que não os salvará. Porque lutam eles afinal? Qual o objectivo desta guerra sem sentido? Desde que cheguei, há dois anos atrás, vi todos os homens deixarem os seus postos para pegarem em armas e combater no meio de pessoas com sede de vingança, no campo de batalha sangrento que tanto queriam evitar. Hoje foi a minha vez. Pela primeira vez entrei num campo de batalha e disparei sobre aqueles que um dia jurei proteger, sem pensar na raça ou religião. Em quem me tornei, Anne? Aquilo que sinto é tão difuso como a esperança de voltar em breve.

O desespero toma conta de mim à medida que o tempo vai passando e a distância entre nós se adensa cada vez mais. Minha querida, faz-me voltar para ti…

A dor e a solidão preenchem todo o meu ser e eu duvido agora de quem sou ou daquilo que um dia pensei ser. Tu e a Maria são os únicos pedaços de verdade que me restam neste mundo.

Espera por mim por favor… Amo-vos.

*

Os sinos da igreja repicam e eu sei que está quase na hora de voltar para junto da nossa filha. Os grãos de areia agitam-se no ar, dançando ao sabor do vento frio que me toca a pele. Sei que não aguentarei muito mais a dor que me invade, mas insisto e leio em voz alta as tuas últimas palavras, como se quisesse contar ao mundo aquilo que sofro.

*
12 de Março de 2009

Anne…

Escrevo-te, aproveitando as réstias de luz que esta vela me oferece. A luz eléctrica foi cortada ontem e não sei quando voltaremos a ter esse luxo.

As minhas mãos ainda tremem e por isso não estranhes a caligrafia irregular e nervosa. Jerry morreu hoje, vítima de uma bala perdida no meio do campo de batalha. A dor que sinto por perder um tão querido amigo só é suplantada pela dura consciência de que poderei não voltar para ti com vida. A morte torna-se mais real a cada dia que passa e eu sei, agora, que poderei ser o próximo na sua lista infindável de vítimas. Sei que me poderás achar dramático mas isto é somente aquilo que vejo ao meu redor. O manto negro do luto cobriu todo o quartel e todos nós carregamos nos ombros o peso de um caixão já prometido pelas armas impiedosas dos nossos inimigos.

Meu amor… se isso acontecer não chores. Não vertas lágrimas pela minha perda. Alegra-te antes por aquilo que vivemos e por te ter deixado mais do que a minha própria vida, por te ter deixado a Maria. Se isso acontecer, acaricia os seus caracóis negros e canta mais do que uma canção de embalar. Uma para mim e outra para ela.

A luz da vela extingue-se enquanto escrevo estas parcas linhas. Tenho tanto para te dizer, tanto para te declarar mas sei que nada disso é suficiente. Por isso, vou confiar que mesmo longe lês o meu coração e que sentes em ti o amor infinito que te tenho.

Nunca me esqueças meu amor, pois eu sei que a tua imagem vai ser a última a extinguir-se na minha mente.

Amar-te-ei para sempre…

*
Ergo-me com dificuldade. Os soluços que fazem estremecer o meu corpo aumentam ainda mais quando olho para o último envelope que tenho na mão. Todos os outros jazem no chão ao lado do meu corpo esguio e subitamente envelhecido. Não está aberto, nem nunca o será, mas a faixa negra que o preenche diz-me mais do que as condolências prestadas por alguém que nunca nos conheceu. Foste embora… Partis-te tal como havias dito…

Ouço um leve restolhar de passos, pertencentes a alguém que passeia na praia. Não me viro para saber quem é, pois não quero que vejam a minha dor. Não chorarei para os outros, tal como me pediste, e hoje cantarei duas canções de embalar a Maria. Uma para ti e outra para ela.

“Como sentirei a tua falta, meu amor…”, penso enquanto abro um buraco por entre a areia molhada desta enseada que nos conheceu tão bem. Pego em todos os envelopes e com cuidado e carinho, depositando um beijo em cada um deles, enterro-os junto com as recordações tristes da guerra injusta que te levou de mim.

“Adeus, meu amor” murmuro.

*

Caminho descalça, sentindo a areia moldar os pés. Vou reparando nas pegadas indeléveis que deixo areia, enquanto me despeço de ti. De súbito, as minhas pegadas juntam-se a outras que me parecem familiares. O choque invade a minha mente e captura os meus membros. O tempo volta atrás e eu recordo todas as vezes em que as nossas pegadas se cruzaram neste areal. As lágrimas correm livres novamente. Doce ilusão…

*

-Pára. Pára! Mais cócegas não!

O riso de Maria chega até ao inicio do nosso jardim. Enche o ar de uma maneira melodiosa e eu sinto pela primeira vez hoje um frémito de esperança e amor. Ela é a toda a minha vida a partir de agora.

A minha mente vagueia como que perdida em recordações tão reconfortantes como o calor de fim de tarde que me banha toda a moradia. Porém de repente a realidade cai sobre mim e eu percebo que Maria deveria estar sozinha em casa. Não temos amigos que frequentem a casa, portanto, com quem é que ela fala?

Corro até à entrada, porém quando tento entrar em casa algo pequeno e agitado embate nas minhas pernas.

- Mãezinha!!!- grita ela enquanto me abraça com força.

- Maria, o que aconteceu? Onde vais com tanta pressa? Quem está aí? – pergunto enquanto tento espreitar para dentro de casa.
Maria puxa-me o vestido fazendo com que eu me baixe até ao seu nível. Dá-me um beijo repenicado e sai a correr gritando: - Vou apanhar conchinhas mãe! O pai chegou!

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Ecos

Numa tentativa falhada de fazer um Drabble (falhei em 11 palavras.. shame on me :p) acabou por sair isto... foi escrito num guardanapo enquanto almoçava por isso não há-de sair grande coisa :p




Devagar, como quem adia uma decisão, fechas a porta da nossa vida em conjunto . Ela não range, não geme e nem sequer lança um murmúrio leve de madeira a descascar . Nem mesmo o barulho suave do trinco perturba a quietude deste momento. Não fosse o facto de ouvir cada um dos teus passos pesados ecoados nas escadas e poderia afirmar que estes últimos minutos nunca se passaram.
Porém, os passos não mentem e são eles que me revelam a tua reacção às minhas últimas palavras. A calma com que pisas o chão e a languidez que dedicas a cada movimento confessa-me que a tua partida hoje foi apenas física. O teu coração e a tua mente à muito que já não moravam aqui.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Excerto "A Sangue Frio"




Corri o mais que pude sem sequer olhar para trás. O vento e a chuva fustigavam-me o rosto mas eu mal os sentia. As lágrimas salgadas misturavam-se com as gotas doces vindas das nuvens mais carregadas do céu, daquele que já fora o nosso céu.
Quando reconheci os edifícios que me rodeavam percebi que me encontrava finalmente longe do perigo que me perseguia. Foi quando o receio de ser encontrada me deixou, que as forças me abandonaram e caí desamparada no chão, deixando que a lama se misturasse com os fios dourados do meu cabelo. Levantei-me a custo até encontrar o degrau de uma escada onde me pudesse abrigar da chuva e chorar a humilhação que me havias feito passar. Sentei-me e juntei os joelhos ao peito, abraçando-os com os meus braços e sentindo-me finalmente segura entre paredes que não conheciam o meu desgosto mas que me escondiam e protegiam. Não sei se passaram horas ou se apenas alguns minutos, pois caí num estado de semi-adormecimento embalado pelo ténue sussurrar do vento. Mas despertei ao ouvir passos que caminhavam na minha direcção. Levantei-me de súbito e espreitei para a rua, com o coração a bater descompassadamente e com o pensamento de que seria o fim de tudo. Lancei um olhar rápido e encarei um sem-abrigo que se assustou tanto quanto eu, e que se apressou a fugir na direcção oposta, olhando por cima do ombro com uma expressão de horror. Eu sabia o que o tinha assustado…
O frio começou a tornar-se cada vez mais intenso e sentia o corpo dorido. Precisava de sair dali e ir para um sitio onde pudesse descansar. Sabia a quem tinha de ligar, mas o telemóvel havia ficado em cima da mesa da entrada e comigo apenas ficara a mala minúscula que levara para o maldito jantar. Tinha que encontrar uma cabine telefónica, mas não fazia ideia onde a encontrar. Deambulei durante horas, até encontrar uma que funcionasse e aí já o sol despontava no horizonte e a cidade começava a agitar-se para começar outro dia frenético. Vi o meu reflexo no vidro da cabine e finalmente percebi a dimensão daquilo que me tinhas feito. O meu olho estava inchado e quase fechado, o meu lábio tinha ainda sangue, já seco, junto ao corte que me ardia quando tocava, tinha o cabelo coberto de lama e a minha cara era um mapa de arranhões.
Sentia-me exausta e só consegui chorar quando Daniela atendeu a chamada. Felizmente reconheceu a minha voz e eu consegui balbuciar o sítio onde me encontrava, “Vou já para aí!” foram as suas palavras. Deixei o corpo escorregar para a calçada e perdi-me na dor que me assaltava. Foi nessa noite que eu senti o ódio sobrepor-se ao amor que eu julgava sentir e aí decidi que tudo iria mudar.
Foi assim que fugi de ti. Desse perigo que eu própria convidei para a minha vida. Pensei na humilhação que me havias feito passar nessa noite, e durante todos os anos em que estivemos juntos e decidi interiormente que nunca mais iria pisar esses caminhos de derrocada, trilhados pela morte lenta. Libertei-me daquela letargia que me fazia permanecer caída naquela calçada e ergui-me, calma e confiante. Quando Daniela chegou, espantou-se pela mudança súbita no meu comportamento. A mulher amedrontada que lhe falara ao telefone não exista mais e eu jurava que ela nunca mais voltaria.

terça-feira, 15 de junho de 2010

A ti... Pai...




Hoje partiste.
Sem me avisares ou sequer pensares em despedir-te.
Tudo aconteceu demasiado depressa e quando dei por mim percebi que nunca mais voltaria a ver esses teus olhos escuros que me abraçavam sem tocar. A irrealidade de tudo isto envolveu-me formando uma concha à minha volta. Os rostos familiares que me rodeiam nada me dizem e a sensação de que bastaria um carinho teu para acordar deste pesadelo mantêm-se durante dias. Espero-te pacientemente.

Mas tu não vens… nem nunca mais virás.

Olho para o objecto à minha frente e não o reconheço. A fotografia pousada na entrada é a tua mas a minha mente recusa a assimilar a situação. Tu não estás ali e eu não estou aqui. Tudo isto não passa de uma ilusão macabra da minha mente, não é?

60 segundos.

Foi este o tempo que tive para voltar a sentir a realidade entranhar-se no meu corpo. Agora que já não te posso tocar e que nunca mais verás o sol é que entendo que tudo é verdade.
Aquele eras tu e aquela era eu. As palavras vãs de condolências são dirigidas a mim e o meu olhar é o que compadece estas pessoas. Foste mesmo embora não foste?
Preciso de chorar eu sei… Mas o vazio cheio de solidão e saudade eterna são muito mais profundos do que meras lágrimas perdidas num rosto marcado pela tua ausência.

Fujo das vozes que me rodeiam e albergo-me num espaço em que o silêncio exalado pelas paredes brancas me protege do terror de estar acompanhada por outros sem seres tu. Inspiro lentamente e vem até mim o teu cheiro característico, a tabaco e a vida, provenientes de recordações infantis. Enquanto caminho., descalça e apreensiva, por este chão de mármore gelado, as recriminações enchem a minha mente. Devia ter-te dito mais vezes que te amava? Devia ter-te abraçado com mais força? Agarrado mais vezes a tua mão? Guardar-te com mais cuidado para que nunca me deixasses?

O meu coração torna-se pesado de culpa e finalmente as lágrimas teimam em sair. Não de dor ou saudade, mas de raiva contra mim própria por não te ter protegido como fizeste comigo a vida inteira. Merecias mais! Choro compulsivamente e deito-me no chão, enrolada sobre mim própria enquanto canto baixinho a tua música preferida. Exausta de emoções deixo-me cair num sono profundo onde tu passeias entre sonhos.

-Sai daí! Ainda te vais aleijar! - Disseste com ar zangado.
-Não vou, não vou! Eu quero subir lá acima! - Respondi-te eu com a voz mais meiga que conseguia. Não queria que me viesses buscar e aquele ovo de pássaro lá em cima estava mesmo à espera que a minha mão rechonchuda o apanhasse.
- Mas tu não percebeste que está demasiado longe? Vais escorregar e cair! - Ignorei a tua frase desconhecendo ainda que conseguias ver mais que eu. Devia ser por seres mais alto.
-Estou quase l… - A minha última palavra perdeu-se no ar. O meu pé escorregou na resina da árvore e eu caí desamparada na relva fofa do quintal. Olhei primeiro para ti antes de chorar, com medo que dissesses “Eu bem te avisei”, mas a tua cara de preocupação era tanta que eu percebi que estavas tanto ou mais aflito do que eu e por isso dei azo à choradeira.
-Pronto, Pronto já passou – A tua voz soava aliviada e paciente por veres que eu estava bem. Passavas-me a mão pelo cabelo e beijavas-me a testa de maneira suave. Senti o calor do teu corpo e senti-me feliz por estares ali comigo. Abracei-te com força e sequei as minhas lágrimas no tecido áspero do teu casaco, enquanto me levavas ao colo para casa.

Verão. Um calor abrasador e eu com os calções e a t-shirt que mais gostava. Sai de casa a correr e aspirei o ar puro que uma terrinha tão esquecida me oferecia. Sabia que era dia de diversão, porque já te tinha visto encher as braçadeiras para irmos para a barragem.
- Despacha-te, querida! Se não quando lá chegarmos já é de noite!
-Vamos de mota? Sim, sim, sim? Por favoor! - Sorriste perante a minha insistência e explicaste-me devagar que éramos três e que não cabíamos.
-Podia ir ao colo do Flávio…
A tua gargalhada soou pela rua toda e até a vizinha da frente interrompeu a sua jardinagem para olhar na nossa direcção. Só eu mesmo é que ainda acreditava que três pessoas cabiam numa mota. Como era tudo tão simples.
O Flávio veio em meu auxílio e prontificou-se a ir de bicicleta até à barragem. Assim fazia exercício, dizia ele. Eu sabia que ele só dizia aquilo para me agradar. mas não disse que não, apesar de saber que ainda tinha que pedalar muito. Ou isso, ou queria ganhar músculo para mostrar aquela rapariga que olhava muito para ele lá na escola.
- Está bem… então assim podemos ir!
-Ena, ena !- gritei com um sorriso de orelha a orelha, correndo para ti e depositando-te um beijo na bochecha, rugosa da barba.
Puxaste-me para cima da mota e com um barulho surdo ligaste-a, começando a marcha. Como o Flávio ia à frente de bicicleta todo o passeio foi feito lentamente e eu apreciei cada minuto. Enquanto sentia o teu corpo junto ao meu e abraçava com força a tua barriga, com medo de cair, deliciei-me com os pontos na paisagem que tu me mostraste. Pensei que estarias para sempre comigo. Até hoje estão gravados na minha mente e aquele momento, em que partilhaste comigo mais do que apenas palavras vãs, gravado na minha pele.

As pessoas olhavam-nos e eu sabia porquê. Tu estavas mais bonito do que nunca, sofisticado e com um ar feliz e orgulhoso e eu vestia o vestido branco mais bonito do mundo. O meu vestido de noiva. Levaste-me pelo braço, percorrendo comigo a passadeira vermelha que me levava até aquele que cuidaria de mim agora. O teu braço foi-se tornando cada vez mais apertado e eu soube que me dizias sem falar que me amavas.
-Está entregue… Disseste enquanto apertavas a mão do meu futuro marido e as lágrimas assomaram aos meus olhos.
Beijaste-me com ternura e afastas-te dando-me o meu momento.

Acordei embalada pelas tuas memórias e estranhamente sorria. Como poderia sorrir quando tu havias acabado de partir para sempre?

Senti paz e a certeza de que agora descansavas. Que os sofrimentos passados em vida finalmente tinham sido apagados e que nunca mais voltarias a sentir dor. As recordações vivas que tenho tuas, do som do teu riso, do toque da tua mão, da tonalidade da tua pele, são pedras preciosas que vou guardar sempre e que te manterão vivo junto a mim por mais anos que passem. Tu garantiste isso ao ensinar-me a viver, a amar, a querer e a escolher. Foste o meu guardião e mentor e viverás por mim, quando em cada frase, em cada respiração a tua influência se reflectir em mim.

Sei que não estás em nenhum domínio espiritual e sei também que não me consegues ouvir mas isso acalma-me. Estás simplesmente a dormir.
Por isso penso baixinho quando te agradeço mentalmente tudo o que me deste e aquilo que foste e ainda és para mim. A saudade será eterna e a dor reaparecerá novamente mas eu espero apaziguá-la garantindo que serei a mulher que tu gostarias que eu fosse.
Por tudo, Obrigado.

Até um dia, Pai!

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Para o Nuno e a Sara :)




Obrigado pelo óptimo dia que nos proporcionaram :)

Que sejam muito felizes queridos amigos :D

quarta-feira, 9 de junho de 2010

A tua ausência...



A TUA AUSÊNCIA

O sol já se pôs… A tua altura do dia preferida. Adoravas sentar-te nesta mesma poltrona onde estou, comigo aninhada no teu colo, e presenciar um dos grandes fenómenos da natureza, como tão sabiamente dizias. Gostava de o fazer também agora, procurando assim algo que me ligasse a ti, porém desde que partiste, tornou-se um fardo demasiado pesado, acordar as memórias. Agora quando olho pela mesma janela, concentro-me antes na azáfama da multidão que corre lá em baixo na rua, rua que tantas vezes percorremos abraçados. Ao olhar para eles, tento afastar-me de mim. Do meu interior escuro e sombrio, forrado com o mais triste sentimento. Consigo focar-me em algumas pessoas e esquecer-me de mim, de nós. Mas hoje não funcionou. Apesar de me tentar focar nas cores, nos movimentos, nos cheiros que vem da rua, tudo o que me invade a mente é a tua imagem. E de repente a minha imaginação prega-me novamente uma partida e eu vejo um vulto que se parece exactamente contigo. Eras tu? Aquele vulto que surgiu de repente eras tu? Poderia jurar que sim mas sei que não juraria em verdade. Desde a tua partida que a minha mente me ilude e eu julgo vislumbrar-te no meio da cidade, desta multidão agitada que polvilha Lisboa. Sinto o teu perfume, ouço o teu riso, avisto o teu passo ligeiro e desengonçado. O meu coração pára mas só até perceber que não és tu.

Olho pela janela e vejo que começou a chover tal como no dia em que partiste. Primeiro, apenas algumas gotas que vieram brincar no vidro, depois uma torrente de água que desce pela avenida.
Sabes o que isto me lembra?
Será que ainda te consegues lembrar dos nossos momentos mesmo apesar da distância?
Espero que sim mas temo que não.
Lembra-me aquela vez quando ficamos horas debaixo da chuva, a sentir cada gota a entranhar-se na nossa pele, mas com a plena convicção de que não sairíamos dali porque isso significaria separação.
Mas afinal foi o que aconteceu, não foi?
Ainda hoje me pergunto o porquê, mas aos poucos fui desistindo de tentar encontrar respostas que estão fora do meu alcance. Respostas, que se encontram no mais intimo de ti, no meio dos teus labirintos, cuja porta são os teus olhos meu enigma.

Olho pela janela e aprecio as novas cores que pintam o céu agora. O sol já se pôs e o céu cobriu-se de cinzentos e negros que fazem adivinhar uma noite repleta de estrelas. Vês as mesmas estrelas do sítio onde estás? Pensas em mim tal como penso em ti, meu amor?
Sabes, apesar de lindas, são estas as cores que associo à tua ausência, ao vazio que ficou no teu lugar. Foram estas as cores que tu usaste para tingires a tela dos meus dias desde que partiste.
Pergunto-me se já não me amarás ou se a nossa história é agora apenas uma lembrança rasurada na tua mente.
Apesar de tudo, continuo a procurar-te entre os estranhos que encontro no caminho para casa, continuo a procurar pela tua presença, por algo que me ligue a ti de uma maneira indelével.

Esqueci-me de te pedir uma coisa na primeira e última carta que te escrevi. Logo depois de partires, naquele enorme avião que te levou para milhares de quilómetros de distância, percebi que tinha deixado, uma coisa que me é imprescindível, contigo. Podes, por favor, procurar? Talvez nos bolsos das calças, na mala ou.. não, não! Esquece tudo e procura no bolso interior do casaco, naquele perto do coração. Encontraste? O meu bocadinho de coração foi à procura do teu e acabou por ficar contigo. Importas-te de me devolver? Farias isso? Ou irias ser teimoso e guardá-lo só para ti?

Olho pela janela e surpresa! Tal como chegou a chuva foi embora e deixou-me sozinha. Era o seu som que me embalava ternamente nos meus doces pensamentos sobre ti.
Não quero ficar sozinha, por isso começo a pensar em que livro irei pegar para me tentar transportar para outro mundo, Um mundo em que nós não existimos e em que o único silêncio vazio é aquele entre parágrafos.

Estão a tocar à porta e sobressalto-me com o som da campainha. O “Trimmm Trimmm” insistente já é desconhecido para mim. Desde que saíste que não recebo os amigos em casa e muitas vezes quando a campainha toca estou tão absorta em recordações que nem noto. Porquê, perguntas tu? Porque todos os amigos me fazem lembrar de ti, da tua voz, da tua presença junto a mim quando nos reuníamos à sexta-feira à noite para relaxar. Tornei-me uma má companhia, pois a única presença que realmente anseio é a tua. Antes de abrir a porta, volto-me de novo para a janela e reparo num olhar demasiado familiar. Mas quando olho novamente já não está. Hoje as memórias afloraram mais do que o costume.
Sinto a tua falta…

Abro a porta ainda melancólica e vejo uma senhora, vizinha parece, um rosto que não reconheço, com uma carta na mão. Entrega-me e diz-me que o correio se enganou e pôs na caixa de correio dela. Será que foi isto que aconteceu com as tuas cartas? Extraviaram-se antes de chegar até mim, por isso é que nunca as recebi? Ou simplesmente não as escreveste?
Volto-me decidida a mergulhar em literatura e esquecer a saudade por umas horas, quando novamente a campainha dá sinal. Suspiro, contrariada porque não me apetece manter conversa com pessoas estranhas, nem magicar palavras simpáticas quando tudo o que quero é gritar de desespero. Engulo as lágrimas que vieram sem serem chamadas e abro a porta … o mundo pára, o coração bate descompassadamente e os joelhos cedem.
Deixo-me cair no chão, incrédula da veracidade deste momento. Não posso acreditar… és tu.. .tu… o vulto da minha imaginação! Como podes ser tu?
Os teus braços envolvem-me, a tua respiração aquece-me e eu tenho finalmente a certeza - és meu novamente!

Olho pela janela, uma última vez antes de me perder em ti e observo a chuva. Ela voltou, desta vez não com som de despedida e solidão. As gotas da chuva desenham na janela pontos indecifráveis enquanto a tua voz me sussurra ao ouvido, a única coisa que esperei ouvir depois de tanto tempo - “Amo-te”

terça-feira, 8 de junho de 2010

Mariza - Barco Negro

Finalmente algo que me inspire :)

Vi o clip e não resisti a escrever alguma coisinha rápida...







A areia toca-me o corpo coberto de negro. Sou um ponto escuro no meio de um sedoso chão dourado, que me envolve enquanto choro. O som das ondas embala-me o pranto e a tremura vaga de um corpo fraco. Vejo-te ao longe, perdido no mar agitado que, eu sei, não te trará de volta. O cheiro desta praia vazia enche-me os sentidos e ecoa na maresia o som agudo da tua saudade.

Levanto-me a custo, obrigando o meu corpo a obedecer, e arrasto os meus pés até à água. Já não te vejo e, por isso, sei que a despedida foi para sempre. Ao chegar-me mais perto da linha de água, a bainha do meu vestido, preto como a profundidade do meu ser, molha-se com as lágrimas salgadas que derramaste ao partir. Minto a mim mesma e ganho a certeza de que voltarás. Quero acreditar, porém o vazio que me preenche as entranhas não desaparece.

Ouço o silêncio da tua ausência ao mesmo tempo que estendo a mão para tocar a tua, lá ao fundo, imaginariamente acenando. Um leve sorriso toca-me os lábios e sonho que são carícias tuas, espalhadas em memórias já esquecidas. Uma sensação de paz ameaça entrar, mas o vento volta e traz na bagagem as palavras maldosas das velhas mulheres da praia: “ Ele não voltará… não voltará”. O burburinho alcança-me o coração e, com as suas mãos tristes, aperta-me o coração até eu sentir sangrar .. . A dor sufoca-me.

Rasgo as roupas enquanto canto aos mares e às areias que me rodeiam a loucura dessas mulheres: “Loucas…são loucas”. O mundo parece ouvir-me e tudo se queda novamente em silêncio. Tudo menos os incessantes queixumes que teimo em deixar sair.

Vejo-te do outro lado da praia… Afinal nunca partiste. A minha voz eleva-se e enche o céu, ao mesmo tempo que tento chegar a ti: “ Eu sei, meu amor, que nem chegaste a partir, pois tudo em meu redor me diz que estás sempre comigo.”

A tua imagem esfuma-se e tudo o que resta é uma mulher vestida de negro, deitada numa tela dourada e áspera, agarrando os resquícios da presença de quem já lá não está.

A Walk trought the park... (excerto)





Sento-me no banco frio e impessoal que tantas vezes me albergou quando precisei descansar o corpo das feridas amargas da mente. O tempo passou mais depressa do que eu esperava, mas as marcas deixadas na pele nunca desapareceram. É delas que fujo quando passeio pelo parque que se tornou o meu refúgio, desde que a solidão de estar rodeada de pessoas indiferentes se tornou pesada demais para ser suportada dentro de quatro sufocantes paredes brancas.

Ouço o leve restolhar das folhas no chão, o riso traquina e inocente das crianças que brincam ao fundo do caminho ladrilhado de pedras regulares e de vivências mortas pelo tempo. Sinto a leve brisa outonal no rosto e aspiro aquele aroma vermelho e laranja que polvilha as manhãs de Paris. É nestes raros momentos que me sinto mais perto de ti, daquilo que me ensinaste e que prontamente esqueci numa singela noite de Verão em que os sonhos ilusórios venceram a razão térrea que me ajudaste a criar.

Durante seis décadas de dias passados, pensava eu a conta-gotas, nunca te escrevi. Nunca manchei um único pedaço de papel com a minha caligrafia irregular para te contar o porquê de tudo se ter apressado daquela forma. Foi hoje a primeira vez que trouxe comigo um caderno antigo, onde ainda residem vestígios do teu aroma e resquícios das flores secas, resultado dos nossos encontros furtivos. Não sei bem porque o faço, mas escrevo tendo a certeza que nunca irás ler estas palavras. Tudo isto será apenas um vislumbre de lágrimas desenhadas cuidadosamente em papel mudo. Testemunhas silenciosas da dor e da saudade que me corre nas veias desde que te virei as costas.

Fecho os olhos enquanto me recosto mais, sentido o sol. O calor gélido das recordações que traz no seu regaço reconforta os meus ossos cansados e reluz nos cabelos brancos que já desisti de esconder. Sem compreender, ouço o rumorejar lento das palavras que brotam do âmago do meu ser. Serão saudade ou solidão? Ou apenas cicatrizes daquilo que poderia ter sido? Pela primeira vez em muitos anos sinto as palavras mais perto da superfície, prontas para emergirem do lago escuro que se tornou o meu interior.
Tentei fechá-las em mim e apagar o amargo sabor do seu travo doce. A pressão que exerciam deixava-me muitas vezes à beira das lágrimas, que escondia numa tela de força arrebatadora, tão frágil e vã como o desprezo que te mostrei. Tudo meras encenações que compunha enquanto me ia esquecendo de mim e daquilo que verdadeiramente era. Mascarar a loucura, a ânsia de liberdade e a saudade de outro corpo era apenas mais um acto na peça de teatro, do êxito de bilheteira em que a minha existência se tornou.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Excerto Foostprints in the sand



(...)Haviam sido semanas consecutivas de ensaios exaustivos que testavam os limites da nossa persistência. Miguel mostrara-se sempre disponível e paciente para enfrentar as minhas manhãs de mau-humor, as tardes de insegurança e até mesmo as noites de absoluta e completa distracção. As infinitas horas pintalgadas pela música que passámos juntos criaram entre nós uma ligação profunda, ténue e quase invisível aos olhos de estranhos mas absolutamente delineada para nós. Ao contrário do que era normal em mim deixei-me ir devagar na sua simpatia, no seu talento e na sensibilidade gritante que emanava dele. Um a um, Miguel lançou para longe, os blocos de silêncio, que compunham as muralhas que tinha construído à minha volta. O seu sorriso fácil e sincero juntamente com a harmonia delicada da sua voz faziam-me sentir segura e sem ter medo de mais nada entreguei-me àquela amizade embalada pelas notas do piano de cauda que nos acompanhava.(...)

(...)Senti o nervosismo voltar quando o vi fechar os olhos e aproximar o seu rosto do meu e as borboletas que sentia esvoaçar na minha barriga agitaram-se ainda mais quando percebi que desejava aquele beijo tanto quanto ele.
Não sei quando comecei a confiar em Miguel, o processo foi gradual e nem me apercebi do dia em que o comecei a considerar meu amigo e agora aqui estava eu, o meu corpo a admitir aquilo que a minha cabeça, sempre demasiado ocupada, se recusara a entender.
Lentamente senti as minhas pálpebras fecharem e o meu corpo encostar-se suavemente ao seu, instintivamente. Quando os nossos lábios se tocaram senti um formigueiro de prazer percorrer todo o meu corpo como se uma onda me tivesse inundado. As minhas mãos deslizaram para o seu cabelo e aí senti-o sedoso e macio por entre os dedos. Por outro lado as suas mãos escorregaram para a minha cintura apertando-me num forte abraço enquanto o seu beijo se tornava mais carinhoso.(...)

Frase de um capitulo ainda não escrito...



" O brilho dos seus olhos respondeu-me muito antes da sonoridade das suas palavras aflorarem a superfície"

Será que a inspiração vai voltar para eu poder escrever a Footprints? Acho que só o tempo o dirá...

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Fragmento da Footprints in the sand (my book)





"Desci a Rua do Alecrim dentro do pequeno eléctrico que todos os dias percorria as ruas de Lisboa. Sentada no meu lugar junto à janela via o frenesim que se vivia lá fora.
Era segunda-feira e as pessoas agitavam-se saindo do trabalho, prontas para rumarem a casa e encontrar o conforto do lar. O eléctrico ia cheio e a multidão à minha volta acotovelava-se para conseguir uma melhor posição. Normalmente toda esta agitação me fascinava e eu apanhava-me a analisar as reacções que me chegavam. Mas hoje não… hoje a minha mente estava perdida nas ondas mais revoltas do oceano de pensamentos que assolava a minha mente. Vagueava entre os prós e contras, entre a consciência e a emoção.
Apeei-me junto ao Largo de Camões satisfeita por abandonar aquele aglomerado de gente que me comprimia. Respirei o ar fresco da noite e olhei em volta. O largo estava polvilhado por grupos de jovens que descontraiam depois de um dia de faculdade. Ainda traziam consigo os dossiers e os livros que os acompanhavam durante todo o dia, mas rapidamente os abandonavam em qualquer vão de escada que ficasse perto de onde se encontravam. O seu riso voava até ao sítio onde eu estava e a descontracção era palpável no ar. Eu reconhecia-lhes os gestos, porque sabia que eu faria exactamente a mesma coisa em outro dia. Ali seria o meu lugar, junto com o meu grupo de amigos, tentando esquecer a pressão dos exames, os trabalhos pendentes ou as horas intermináveis de ensaios que nos esperavam no dia seguinte. Porém, naquela noite não seria assim, porque eu precisava de estar sozinha e pensar. Tinha até arranjado uma desculpa para a Matilde não me acompanhar. Depois da conversa dessa tarde, tinha dito à minha amiga que ia ensaiar (Matilde não me acompanhava aos ensaios desde que ficara doente). Não era mentira, pois de facto iria ensaiar mas não agora. Primeiro precisava de espairecer e relaxar…sozinha.
Senti a brisa fria do vento, apertei mais o casaco contra o corpo e comecei a descer rumo à Brasileira. Sentar-me naquela esplanada e observar os transeuntes que passavam, muitos deles turistas, que se misturavam com a gente desta cidade que os recebera de braços abertos, era das coisas que mais me relaxava. Será que concentrarmo-nos na vida das outras pessoas faz com que a nossa se torne mais suportável?
Sentei-me na única mesa vazia e olhei para o meu colega de esplanada, a estátua de Fernando Pessoa ali estava pronta a fazer-me companhia durante o meu serão. A sua expressão era a de quem esperava pacientemente a passagem do tempo, sem preocupações nem ansiedades. Será que seria assim mesmo a sua expressão quando ainda vivia? Perdida nestes pensamentos que nada tinham a ver com a decisão que tinha que tomar, consegui pedir um café com natas.
Imitei os gestos de Pessoa e abri o livro que trazia comigo. Mas por mais que tentasse ler e conjugar ideias o meu pensamento fugia sempre para a imagem de Miguel.
Recordei-me da primeira vez que o tinha visto, no refeitório do Conservatório, com um círculo de miúdas totalmente derretidas por ele a pedirem-lhe para cantar. Ele, com um sorriso que conquistaria multidões ao longo dos anos, aceitou e em segundos a sua voz enchia toda a sala fazendo com que até os mais distraídos voltassem a sua atenção para ele. Apesar da sua voz quente me fazer arrepiar o único pensamento que me cruzou a mente foi o quão exibicionista ele era. Essa opinião persistia até hoje e sabia que era muito difícil mudá-la.
Como é que poderia trabalhar com uma pessoa assim? Com alguém que me provocava tanta aversão? Mas também não me conseguia deixar de perguntar porque é que ele me afectava tanto. Simplesmente não o conseguia ignorar.
Paguei o café que nem sequer bebi e desci a rua em direcção aos Armazéns do Chiado. O ar estava impregnado do cheiro de castanhas assadas e o fumo característico das panelas dos vendedores povoava aquelas ruas. Como era bom sentir o pulsar de vida em Lisboa! Sentir estes cheiros que se misturavam com a voz desconhecida de tantas pessoas.
Andei durante uns vinte minutos, vendo montras e visitando alfarrabistas tentando que algo me cativasse. Tentando fugir da decisão iminente que tinha que tomar.
E se ele não aceitasse? De certeza que todas as raparigas do Conservatório já haviam tentado que Miguel se tornasse seu parceiro. Porque é que havia ele de me dizer que sim a mim?
Pensei em voltar para trás e apanhar o eléctrico para casa, confiando que a minha almofada seria a minha melhor confidente, mas de repente chegou até mim uma voz inconfundível que estava entrelaçada à história de Lisboa para sempre. Segui o som dos acordes da guitarra portuguesa e o tom daquela voz que arrastava multidões. No meio da baixa lisboeta uma carrinha de fados parava e deixava os turistas apreciarem a voz de Amália. O choro da guitarra fascinava a todos e a saudade que estava patente naquela voz deixava uma lágrima no canto do olho. Os meus olhos fecharam-se e senti cada toque daquele fado. Percebi o quanto a música de Amália e o seu talento tocavam cada um do presentes e percebi que o que eu mais queria era que a minha música influenciasse assim os sentimentos dos outro, que os tocasse de forma tão profunda…Valeria isso todos os sacrifícios?"

terça-feira, 1 de junho de 2010

When i look at you.....

A música não me sai da cabeça e já me inspirou em diversas situações (apesar da miley cyrus ser fraquita :p) mas o David Bisbal dá um toque latino que torna tudo muito melhor ;)




Feiras do Livro = Perdição

Mas porque é que há feiras do livro que nos fazem perder a cabeça???

Mesmo depois de muitas despesas e de ter imensos livros em fila de espera dou por mim a não resistir ao impulso e a comprar dois livros na feira da Bertrand que está no Chiado *.*

E eles são...............................................................

Como a água que corre de Marguerite Yourcenar :)

Sinopse:
Como a Água Que Corre, chamou Marguerite Yourcenar ao conjunto de três novelas, que compõem este livro.
Como “a água do rio”, explicou, “ou por vezes da torrente, ora lamacenta, ora límpida, que a vida é”.
São três as novelas que o compõem.
Anna Soror, escrita em 1925 (tinha a autora 22 anos), publicada com pequenas alterações de estilo em 1935 e hoje retomada, apenas com os acrescentos a que a sua própria maturidade obrigou.
É a história do breve e eterno amor de dois irmãos, vivido numa Nápoles renascentista, entre paredes austeras e campos escaldantes.
Um Homem Obscuro centra-se no personagem de Natanael, que parece tê-la habitado desde os 20 anos, mas que só em 1979-81, num período da sua vida “atravessado por acontecimentos e viagens”, subitamente irrompe e toma forma.
Uma Bela Manhã prossegue a história de Natanael, o homem simples, de alma límpida que viveu nos Países Baixos do séc. XVII, através do relato da vida itinerante e multiplicada de um filho seu.
Todas elas têm a sua origem comum numa obra publicada em 1935 sob o título La Mort Conduit l’ Attelage (A Morte Conduz a Carruagem). Desse título de então, diz-nos Yourcenar que não o reteve por lhe parecer hoje demasiado simplista. Descobriu que “a morte conduz a carruagem, mas a vida também”.
Bastará esta frase para dar a conhecer a essência da obra desta mulher simples e antiquíssima ao mesmo tempo camponesa e bruxa e grande dama.


As coisas que nunca dissemos de Marc Levy :)

Sinopse
Julia Walsh sempre teve uma relação difícil com o pai. Quase nunca se viam, mal se falavam e, das raras vezes em que estavam em contacto, acabavam sempre a discutir. Três dias antes do seu casamento, Julia recebe um telefonema da secretária do pai. Tal como ela esperava, Anthony Walsh não vai poder comparecer ao seu casamento. Contudo, tem uma justificação inabalável: está morto. Julia não consegue deixar de ver o lado tragicómico da situação. De um momento para o outro, passa da preparação de um casamento para a preparação de um funeral. Até depois de morto, Anthony Walsh parece ter o dom de transtornar a vida da filha. Mas, a seguir ao funeral, Julia descobre que o pai tinha mais uma surpresa reservada: a maior aventura da sua vida e, finalmente, uma oportunidade de dizer tudo aquilo que sempre calou… No seu comovente e divertido novo romance, Marc Levy cria um mundo de intriga e suspense, através de uma história sobre a força do amor.


E tudo por 10€ :D

P.s: Ainda vou descobrir porque é que não estou a conseguir pôr imagens -.-

Os verdadeiros génios vivem para sempre...




O que há em mim é sobretudo cansaço

O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...

Álvaro de Campos