Inspiração



Um bocadinho de mim em palavras soltas, libertas pela digitalização da mente.

terça-feira, 8 de junho de 2010

A Walk trought the park... (excerto)





Sento-me no banco frio e impessoal que tantas vezes me albergou quando precisei descansar o corpo das feridas amargas da mente. O tempo passou mais depressa do que eu esperava, mas as marcas deixadas na pele nunca desapareceram. É delas que fujo quando passeio pelo parque que se tornou o meu refúgio, desde que a solidão de estar rodeada de pessoas indiferentes se tornou pesada demais para ser suportada dentro de quatro sufocantes paredes brancas.

Ouço o leve restolhar das folhas no chão, o riso traquina e inocente das crianças que brincam ao fundo do caminho ladrilhado de pedras regulares e de vivências mortas pelo tempo. Sinto a leve brisa outonal no rosto e aspiro aquele aroma vermelho e laranja que polvilha as manhãs de Paris. É nestes raros momentos que me sinto mais perto de ti, daquilo que me ensinaste e que prontamente esqueci numa singela noite de Verão em que os sonhos ilusórios venceram a razão térrea que me ajudaste a criar.

Durante seis décadas de dias passados, pensava eu a conta-gotas, nunca te escrevi. Nunca manchei um único pedaço de papel com a minha caligrafia irregular para te contar o porquê de tudo se ter apressado daquela forma. Foi hoje a primeira vez que trouxe comigo um caderno antigo, onde ainda residem vestígios do teu aroma e resquícios das flores secas, resultado dos nossos encontros furtivos. Não sei bem porque o faço, mas escrevo tendo a certeza que nunca irás ler estas palavras. Tudo isto será apenas um vislumbre de lágrimas desenhadas cuidadosamente em papel mudo. Testemunhas silenciosas da dor e da saudade que me corre nas veias desde que te virei as costas.

Fecho os olhos enquanto me recosto mais, sentido o sol. O calor gélido das recordações que traz no seu regaço reconforta os meus ossos cansados e reluz nos cabelos brancos que já desisti de esconder. Sem compreender, ouço o rumorejar lento das palavras que brotam do âmago do meu ser. Serão saudade ou solidão? Ou apenas cicatrizes daquilo que poderia ter sido? Pela primeira vez em muitos anos sinto as palavras mais perto da superfície, prontas para emergirem do lago escuro que se tornou o meu interior.
Tentei fechá-las em mim e apagar o amargo sabor do seu travo doce. A pressão que exerciam deixava-me muitas vezes à beira das lágrimas, que escondia numa tela de força arrebatadora, tão frágil e vã como o desprezo que te mostrei. Tudo meras encenações que compunha enquanto me ia esquecendo de mim e daquilo que verdadeiramente era. Mascarar a loucura, a ânsia de liberdade e a saudade de outro corpo era apenas mais um acto na peça de teatro, do êxito de bilheteira em que a minha existência se tornou.

4 comentários:

  1. Gostas mesmo? *.*

    Não leste o texto todo?

    Se quiseres ler apita :p

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  2. Adorei este excerto, Miri *_*

    Está absolutamente delicioso. É simples, mas ao mesmo tempo complexo. Transmitiu-me uma sensação de flutuação fantástica!

    Adorei as antíteses que utiluzaste! "Tentei fechá-las em mim e apagar o amargo sabor do seu travo doce."
    Conseguiste captar uma sensação de melancolia e nostalgia bastante profunda, na minha opinião.

    E, mais uma vez, continua presente a influência da escrita clássica nos teus textos...O que eu adoro^^ As temáticas que retratas e a maneira como as descreves têm muito dessas raízes. Eu, que venero os clássicos, não podia gostar mais disso =)

    Mais um texto excelente, Miri! Quero ler o resto, pode ser? ^^

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  3. Aww loide *.*

    Deixas-me derretida com tanto elogio xD

    Claro que podes ler o texto :D

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